segunda-feira, 21 de dezembro de 2020

Sou uma menina

O que nos faz olhar para um produto e nos sentirmos atraídos por ele? Este desejo de possessão e identificação é algo involuntário, independente de cada um de nós enquanto indivíduos, ou um produto de regras e ideias que nos foram incutidas sem nos apercebermos? 

    Foi uma pergunta que surgiu e que me deixou apreensiva por ser algo que nunca tinha questionado, e agora que o fazia, parecia absurdo pensar na possibilidade dos meus gostos não serem pessoais, uma ideia assustadora. Afinal que entidade é esta que sempre julguei ser eu? 

    O mundo é tão diverso e no entanto, esta minha identidade é quase idêntica ao resto das pessoas. Como é que isto é possível? Sendo que sou livre e honesta comigo mesma enquanto construo a minha pessoa, respeitando os meus desejos e vontades?

    A minha identidade, começou se a manifestar antes sequer do meu nascimento. Estava eu na barriga da minha mãe e metade dos meus atributos enquanto indivíduo já estavam definidos e resolvidos, sou uma menina. A questão é que associada a essa única palavra de ‘’menina’’, definida pelo meu sexo, estão milhares de concepções que são imediatamente determinadas e delimitadas. À medida que cresço aceito e desenvolvo inconscientemente todas essas concepções, porque nem coloco a hipótese de não o fazer. 

    Estas concepções desenvolvem-se em redor da “minha” sexualidade que é algo decretado a partir do meu sexo. É à partida inquestionável e molda a minha identidade, que sempre tomei como inerente à minha pessoa. É o normal, e o que está para além do normal soa duvidoso e incorreto. 

    Mas não consegui de deixar de pensar sobre isto, e comecei a achar injusta a maneira de como idealizo e construo a minha pessoa. Senti uma estranha sensação de sufoco por me aperceber das limitações que definem a minha sexualidade que sempre assumi e nunca ponderei.

    No outro dia estava a olhar para a televisão enquanto passavam anúncios. Apercebi-me que maior parte deles eram dirigidos ou para o homem, ou para a mulher, era muito raro aparecer um anúncio cujo público alvo fossem ambos os sexos em simultâneo. Questionei-me do porquê de existir esta espécie de restrição que faz com que as mulheres e os homens se sintam atraídos para produtos que evidenciem a sua sexualidade, no entanto não consegui encontrar uma resposta que me deixasse satisfeita. E porque é que toda a gente se conforma com esta maneira de consumir e produzir o que vai de encontro à sua sexualidade? Porque é que o facto de fugirmos a estas concepções é considerado fora do normal? São questões que me deixam a pensar e às quais ainda não consegui responder.