segunda-feira, 4 de janeiro de 2021

Uncanny

É um conceito Freudiano que surgiu a partir da história de E.T.A Hoffmann. Em que Freud identificou que algo familiar a pessoa se tornaria estranho ao ser alienado no processo de repressão. Como "Waxwork dolls, automata, doubles, ghosts, mirrors, the home and its secrects, madness, and served limbs are mentioned thought The Uncanny, influencing, paiters, to explore these themes and blur the boundaries between animate and inanimate,human and non-human, life and death."




quinta-feira, 24 de dezembro de 2020

Marcas de uma crença

  Cresci em ambiente religioso, como é comum em grande parte das famílias brasileiras, aprendi a temer a deus e a todas as entidades maliciosas que a ele se relacionam, fui à igreja todos os fins de semana, fui a retiros religiosos e passei bastante tempo com todos os outros jovens evangélicos, não foi por escolha própria mas era o que parecia correto para uma criança que tinha de obedecer à mãe. Desde pequeno este temor ao mundo e ao pecado foi nutrido em mim, o diabo estava presente a toda hora, conspirava contra mim e contra a minha família, o povo cristão é o mais ''afetado'', pois quem não conhece a palavra de deus não tem a necessidade de ser atentado.
  Eventualmente o interesse na igreja foi-se desvanecendo, a minha mãe trabalhava fora, logo tinha dificuldade em manter esse controlo, eu e as minhas irmãs percebemos que não podiamos ser obrigados a visitar o culto e eventualmente deixamos de ir. A certeza nessa palavra manteve-se durante uns anos, apenas no meu primeiro ano de filosofia na escola é que fui encorajado a pensar por mim mesmo, questionar o que acredito e a razão por trás dessas crenças. Mesmo não vendo sentido no que acreditava, recusei-me a excluir todos os aspetos da doutrina, talvez por esperança de que se um dia fosse julgado, aquela réstia de crença me pudesse levar à salvação.
  Hoje, como adulto, prefiro não confrontar o que acredito, mesmo que a minha mãe insista que eu volte à igreja, com a contínua preocupação na minha salvação, prefiro abstrair-me do assunto, no entanto, diariamente encontro marcas dessas crenças passadas, existe este medo ''racional'', um medo de algo em que eu não acredito, algo que posso racionalizar e mesmo assim ser afetado, isto leva-me a ficar horas acordado, apavorado pela possibilidade de haver alguma presença ao fundo do meu quarto.
  Nos tempos em que vivemos de pânico generalizado, lido com esta parte cristã da família, estórias surreais de templos e anti-cristos, assuntos que descredibilizo facilmente, mesmo que inconscientemente me continuem a afetar a saúde mental. 

quarta-feira, 23 de dezembro de 2020

 

Deixou de ser possível para mim trocar de linha no metro do marquês sem ficar maldisposta e desinspirada. Sem me sentir empobrecida com a (não)interação com um mundo sem texturas reduzido ao consumo…

E o espantoso é que já falei com muita gente que nem reparou na mudança: nos dois écrans publicitários gigantes, com vídeos que me invadem com uma agressividade da qual só consigo escapar se fechar os olhos. É uma poluição visual que domina completamente o espaço, não deixa momentos de calma, mas a sociedade está comercializada a um ponto que as pessoas encaram com naturalidade o papel de consumidores que lhes é imposto ininterruptamente, e não reparam em como a margem para sair dessa relação de consumo é cada vez menor.

 

Estes écrans impõem que no espaço público deixem de existir indivíduos, que reparam no sorriso de uma criança, que se exasperam com o padrão de uns azulejos, que sonham a partir de um olhar…, para passar a existir apenas consumidores estereotipados, cuja atenção é dirigida pendularmente do trabalho para o consumo.

O discurso publicitário, pela sua necessidade de comunicação instantânea, precisa de recorrer a representações reconhecíveis, a estereótipos, que homogeneízam a paisagem urbana que deveria pertencer a todos em liberdade, e não ser dominada de forma tão brutal por valores comerciais.

Fico indignada com esta mercantilização e privatização do que devia ser público. E principalmente, as mensagens comerciais, para além de colonizarem o espaço físico e visual, colonizam também o espaço ideológico, numa hegemonia despótica que põe em causa o espaço público enquanto espaço democrático.

Vénus

     Já faz dias que tento encontrar tema para este pequeno desabafo que convosco partilho. Tem sido complicado, confesso. Desde que tudo isto começou, tornou-se complicado para mim exprimir-me, fazer-me ouvir, e isto, sobretudo porque se tem tornado igualmente complicado pensar. Dou por mim jogada em pensamento nenhum, parece impossível, mas juro que é verdade. Tento concentrar-me e não consigo pensar em nada. Algo como estar fechada numa caixa grande, sentada, com uma tela branca à minha frente, e não existem distrações. Não há distrações, não há pensamentos, não nasce nada, e eu existo, apenas existo. Confesso ainda que durante este últimos meses, apesar de ter sido complicado, tenho tentado estudar e perceber uma parte oculta da minha personalidade. Talvez não oculta assim, mas que de certa forma ignoro, ou penso não me relacionar com ela. Como se uma parte do meu corpo viesse ter comigo umas vezes, e noutros dias desaparecia, como  se já nem fizesse mais sentido. A essa grande carraça que carrego, dei nome de Vénus. Vénus é meu alter-ego. Vénus, que sou eu, (mas não sou) é uma mulher promiscua. Vénus é quente. Vénus é aventura e liberdade. Eu não. Eu sou Pura. Vénus não tem horários, nem compromissos, nem deve explicações. Eu tenho. Adoro Vénus. Queria ser como ela. Mas dou por mim a julga-la, por vezes.

    Em meus trabalhos,  tento sempre fugir destes temas. A mulher, o homem, os seus papeis, as suas posturas, o feminismo, o existencialismo. Enfim, todos os "ismo's". Perseguem-me.

    Inquieta-me aquilo que sou e as minhas vontades.  Já não percebo se gosto de determinadas práticas, e coisas, mesmo materiais , ou se sou levada a gostar. E escrevo sobre isto porque estou confusa. "Um par de sapatos de salto alto não impõem ás mulheres, a partir de fora, a ideia de sexo dominante (os homens) mas usa-los é uma prática ideológica de patriarcado no qual as mulheres participam (..) usá-los é um ato que acentua as partes do corpo feminino que o patriarcado nos treinou para considerarmos atraentes para os homens: nádegas, seios. A mulher participa assim na construção de si mesma como um objeto atraente para o olhar masculino, e como tal coloca-se sob o poder masculino" mas afinal, isto quer dizer, que eu na verdade nem gosto de usar saltos altos, e faço-o porque preciso de corresponder? Mesmo que seja de forma inconsciente? Logo eu, que desde pequena adorava calçar o sapatito bonito de salto da minha mãe?  Talvez seja verdade. Temo que sim. E acho que isto se aplica a tudo, tirando alguns casos, claro, a maioria de nós tem este tipo de atitude porque foi levado a isto, a "embelezar" aquilo que é e possui. "Embelezar" ou "harmonizar" o rosto com maquilhagem e procedimentos estéticos, a "embelezar" o corpo com dietas doidas, horas nos ginásios, e sumos detox, ou chás (agora é mais chá), e no pior dos casos, "a faca". É engraçado pensar que tudo isto não passa de uma farsa lixada que todos vivemos. Que puta de hipocrisia (e ironia) precisarmos usar máscaras para nos enquadrarmos, para sermos aceites como suficientes. E isto desde a forma como apresentamos o cabelo, a pele maquilhada, a roupa que "escolhemos", a forma como falamos, como olhamos, como agimos, não passará tudo de uma enorme encenação? E uma encenação para quê?
     Enfim, um debate oral tornava todo este discurso mais simples. Há momentos em que o que temos para dizer é tanto tanto tanto, que os pensamentos voam à nossa volta e torna-se complicado apanhar todos. É difícil dizer tudo, como se tivesses todas as frutas que gostas numa enorme mesa, mas só tens duas mãos, então agarras nas frutas que consegues, bem rapidinho, cortas, misturas, e fazes uma salada. E muito ficará por acrescentar, e por dizer, e por debater. Mas teremos outras oportunidades. Talvez o que falta nesta salada sejam morangos. Humm manga? Às vezes é a fruta mais saborosa. Espero que não. 

Pela Janela do Quarto

Pode-se dizer que, em retrospectiva, 2020 foi no mínimo, um ano caótico para todos... o começo de uma década que que deveria ser memorável, e de certa forma foi, surpreendeu a todos. Ficamos presos dentro de casa durante meses, houve muitos falecimentos, e uma nuvem de negatividade pairava sobre as pessoas. Pelas janelas dos quartos observávamos o tempo passar,  florestas na Austrália e Brasil eram queimadas, presidentes foram eleitos, mega-eventos foram adiados, a questão refugiada foi ignorada, e a economia mundial sofreu sua maior pancada este ano. Foi um ano extremamente logo paradoxalmente curto.

Acredito que 2020 deixou muitos decepcionados consigo mesmos, projetos foram adiados por 6 meses, depois por até um ano, trabalho e aulas acontecendo via computador e impossibilidade de sair de casa contribuíram para o constante sentimento de insatisfação pessoal e tédio absoluto. As taxas de depressão e suicídio aumentaram pavorosamente. A janela virou a TV dos sobreviventes, e tudo que ia passando lá fora tornou-se digno de registro. Muitos olhavam para fora pois ao se verem obrigados a olhar para dentro não conseguiam. Se em algum momento alguns tiveram a sorte de encontrar com amigos, já não tinham nada para falar sobre, e se tinham era coisa pouca, o assunto morria, e logo voltava-se para assuntos como a vacina ou até mesmo as séries que estávamos assistindo compulsivamente nas plataformas de streaming. O ano, que passou pintado de branco, chega ao fim, e ao olhar nossos reflexos na janela do quarto nos perguntamos o que fizemos de bom, o que faremos ano que vem, etc. Pensamos sobre o rumo da humanidade, sobre nosso progresso pessoal, nos cobramos grandes projetos, e conclusões para eles. Muitos fizeram grandes jornadas de conhecimento próprio, muitos tiveram choques de realidade, e muitos ficaram acomodados presos na inércia da quarentena. 2020 definitivamente não foi o ano das pessoas ambiciosas, só sobreviveu a este ano quem ficou deitado no sofá, sem pensar muito.

A pergunta que trago este ano é a seguinte; o que mudará em 2021 além do número? Será que sobrevivera ao proximo ano quem passou por esse? Ou sofreremos essa seleção natural? Que ser tipo de ser humano 2020 criou, e que sociedade será seu fruto em 2021. 

Vitória Brinker Cunha

terça-feira, 22 de dezembro de 2020

O corpo como reflexo do ego

 A problemática do eu e do corpo está presente na obra de Lacan desde os primeiros momentos de sua trajetória pela Psicanálise. Por meio da elaboração do registo do Imaginário e do esquema conceitual proposto pelo estádio do espelho, ele afirma a importância da imagem do corpo próprio na formação do eu. A referência ao corpo também está presente de forma recorrente ao longo de sua obra, sofrendo reformulações correlativas às retificações que ele introduz. Entretanto, na esteira de Freud, o corpo ao qual ele se refere não é o corpo biológico. O corpo para Lacan é o corpo marcado pelo significante e habitado pela libido, corpo erógeno e singular. Corpo de desejo e, portanto, de gozo, dimensões que certamente contribuem para repensar a problemática do corpo em Psicanálise à luz da nova perspetiva da linguagem.

 

É importante dizer que o Real lacaniano não é o mesmo que realidade. Para Lacan o Real é o impossível, pois ao estarmos a dizer que algo é real é necessário um sentido que, por sua vez, é função do Simbólico e é sempre Imaginário.

O simbólico é o sistema que ordena, é a função do símbolo e também da linguagem, só a partir dele é que se pode ordenar o Real e o Imaginário. O imaginário, muitas vezes assumido como ilusão, trata-se da relação do sujeito consigo próprio e a sua imagem.

Segundo Lacan, o Imaginário será o lugar do Eu. Onde este viverá constantemente enganado por uma imagem que acredita ser o que não é, devido aos efeitos ilusórios e engodativos. O registo do Imaginário corresponde ao ego do sujeito. Tal como Narciso, o sujeito que se ama e, ama o reflexo de si mesmo no outro. Esse reflexo projetado no outro e no mundo, é a fonte de amor, paixão e desejo de reconhecimento, mas também da agressividade e competição. Por possuir um caráter primário, no sentido de antecessor, todas as identificações serão imaginárias em qualquer situação. Essa estrutura sempre se alimentará da perspetiva que o outro tem sobre nós, que conduzirá o desenvolvimento do Eu a partir de identificações ideais e não reais.

Segundo os ensinamentos freudianos, há um estreitamento entre corpo e inconsciente, se Lacan nos diz que "o inconsciente é estruturado como uma linguagem", então é possível dizer que existe uma aproximação entre corpo e linguagem. Podemos interrogar, o que o corpo é capaz de suportar em função da imagem? Esclareçamos que, ao introduzirmos a palavra "suporte", pensamos no sentido de sustentar, como por exemplo, "a linguagem dá suporte à imagem do corpo", como também em suporte associado a aguentar, sofrer, "o sujeito suporta maltratar seu corpo em função de sua imagem".

Vejamos como exemplo as imagens publicadas nas redes sociais, falamos nas imagens de corpos. Procura-se mostrar corpos que passem ideias de perfeição e desejo. Mas será que estas imagens são reais? A imagem, antes de ser capturada, é encenada: escolhe-se o melhor cenário, um angulo que realce as curvas do corpo, uma roupa especificamente usada para aquela foto, etc. Ela é construída com o intuito de passar uma determinada mensagem e conceitos.

Pensar o corpo, do ponto de vista do registo Imaginário de Lacan, implica levar em conta a forma como a imagem do corpo próprio a partir do outro marca a constituição subjetiva e a imagem assumida pelo sujeito. Refere-se à imagem que o sujeito quer passar de si mesmo.

O corpo está enraizado no imaginário, como testemunha a montagem lacaniana. Aparece uno, mas isto não faz identidade. A própria imagem que o fixa inscreverá uma dessemelhança, que impede o sujeito de tomá-lo como corpo próprio.

O corpo do ponto de vista do Real seria sinônimo de gozo, definido não como organismo, mas como "pura energia psíquica, da qual o corpo orgânico seria apenas a caixa de ressonância". Além de, nestas imagens, estar claramente presente um corpo, a ideia não é mostrar uma corpo mas sim um conjunto de símbolos de modo a passar mensagens para o público.

Por fim, o Simbólico aponta para a relação que se estabelece entre fala-linguagem-corpo. Ele diz respeito ao corpo marcado pelo simbólico, no qual as diversas partes podem servir de significantes, isto é, ir além de sua função no corpo vivo. Como já vimos anteriormente, as imagens das redes sociais são encenadas propositadamente para conterem um serie de conceitos e mensagens incorporados e não para mostrarem o seu corpo como um organismo, pelo seu contexto.

 

Concluímos assim que para refletir sobre a veracidade das fotografias mostradas nas redes sociais, ou seja, para explicar o Real torna-se necessário mencionar o Simbólico e o Imaginário. Temos em atenção o corpo e como ele pode assumir outros significados dependendo do contexto que lhe dão.

Neste exemplo, o corpo assume significados e deixa de ser um objeto biológico. Passa a ser a imagem do ego do sujeito.

Com Lacan, evidencia-se a função de captura que a imagem especular exerce e as consequências do facto de que só se tem acesso ao corpo pela sua forma imaginária. Podemos verificar que o corpo é necessariamente definido em relação à falta pela imagem do corpo que inscreverá uma dessemelhança em relação ao próprio sujeito.

Verificamos que partindo da ”fase do espelho”, uma absorção progressiva da imagem na função significante, o que leva à radicalização da relação do significante com o corpo. Se, por um lado, podemos discernir o gozo vinculado ao júbilo da imagem no espelho, por outro, temos uma operação contínua, que inscreve na carne as marcas que serão significadas a posteriori pelo sujeito: "a relação especular vem a tomar seu lugar e a depender do fato de que o sujeito se constitui no lugar do Outro, e de que sua marca se constitui na relação com o significante".

DOIS MUNDOS

 

Saussure apresenta-nos “dois mundos”. O mundo natural - onde nascemos e o mundo dos significados – ao qual vamos acessando, aos poucos, e do qual não podemos voltar.

Transgredimos de um mundo para o outro, através da linguagem e da interação com a comunidade onde estamos inseridos.

Esta distinção, apresentada por Saussure de uma forma tão simples, foi uma das primeiras questões que abordámos nesta cadeira, e que, para mim, parece tão fundamental para compreender o pensamento dos restantes autores.

Dentro deste tema, falámos como os animais podem constituir sociedades, pois podem organizar-se socialmente de determinada forma, mas essas mesmas sociedades não são culturais, pois um grupo de elefantes não tem comportamentos drasticamente diferentes de um outro grupo que se encontre num outro ponto do globo.

Já as sociedades humanas, mudam, a vários níveis, consoante o local e a época onde se encontram e essas alterações não são necessárias, ou seja, poderiam ser de outra forma (arbitrariedade).

Para mim, este foi um ponto importante, porque, por vezes, como seres culturais que somos e rodeados de objetos manufaturados, imagens que reproduzem o real e narrativas construídas podemos esquecer que, primeiro existe o que é natural, e depois, por cima, vamos individualmente e em conjunto acrescentando camadas de significados.

Uma ideia curiosa que explica muito bem o lugar “estranho” e de fronteira que ocupamos, ouvi-a de um poeta cujo nome não me lembro:

"Os Humanos compreendem muito bem, tanto as máquinas, como os animais, mas se um dia os Humanos desaparecessem, os animais não ligariam nada às máquinas."

(Sendo que leio, neste contexto, "maquinas", como tudo o que é construido e não natural).

Escrever

 Eu não gosto de escrever. Escrever para mim é anti-natura. Gosto muito mais do exercício oral porque não tenho de me preocupar em organizar o pensamento e mais dificilmente reparam na minha construção frásica. Talvez seja porque leio pouco, pelo menos é o que me dizem...não sei. O que sei é que não gosto de o fazer. Obviamente que há situações em que sou obrigada a fazê-lo, como agora, mas custa-me e gostava de perceber porquê. Ou melhor, gostava de entender como é que é gostar de escrever e como é que se escreve bem ou como se arranja ideias para a escrita. Nunca poderia escrever um livro. Sempre tive o problema contrário à maioria das pessoas quando tinha uma composição escolar para fazer, escrevia sempre o mínimo de palavras pedidos. Sou apologista de tópicos, talvez tenha um pensamento mais matemático, é a desculpa que gosto de dar. Eu considero-me uma pessoa curiosa e acho que uma pessoa curiosa tem, durante a vida, mais mudanças de opinião, talvez um dia eu aprenda a adorar escrever. Ler é algo que gosto muito mais de fazer, não leio muito, aliás, durante a minha vida não li muitos livros comparando com as gerações mais velhas ou com certas pessoas que conheço, mas gosto de ler, tenho sempre um livro. O problema é que leio devagar e preciso de pausas, mas raramente desisto de um livro. Talvez isso seja uma das razões para não gostar de escrever, devo ter pouco vocabulário, sinto que sou repetitiva a expôr as minha ideias na escrita. Agora não sei mais o que escrever. Talvez o meu raciocínio não tenha introdução, desenvolvimento e conclusão.


Aparência e amor

"Eu quero ir para o atletismo", "Não podes, vais parecer um rapaz"


"Eu quero fazer desporto", "Não, isso é coisa de rapaz, porque é que não brincas com bonecas?" 


As minhas vontades foram negadas porque não sou um rapaz, então não posso ser feliz. Tenho de brincar com coisas que odeio, ouvir música que odeio, ver programas que odeio, usar roupa que odeio, senão não vou ser aceite e não vão gostar de mim. Foi com esta educação que cresci: viver para os outros, viver de imagens. 

E a personalidade e o carácter?? Acho que se eu fizer desporto, já não tenho nada disso. Sou "delinquente, irresponsável e rebelde".
Posso até ser bem educada e generosa, mas o que é que isso interessa se eu não me visto de "maneira selvagem", não uso maquilhagem e não pinto as unhas, se eu não sou "uma verdadeira mulher"?

Nunca ninguém me ensinou sobre amor. Se alguém realmente gosta de nós, então ela aceita-nos, faz-nos sentir bem por sermos nós e só nos deseja felicidade. "A melhor coisa que podes fazer por alguém que te ama é ser feliz". Mas tive a sorte de conhecer as pessoas certas e de poder observar as "erradas". 

Há sempre uma tendência a querer ser gostado e querer agradar, ter uma boa imagem. E, quando caio nessa tentação, eu digo a mim mesma "nunca poderás ser realmente amada se não fores tu própria" e, nesse momento, eu paro de tentar e relaxo. 

Cresci a ver os rapazes "apaixonarem-se" por uma rapariga que mal conhecem, a namorarem pela aparência e eu pensava "e se ela ganhar uma ruga amanhã? Ou se ela precisar realmente de alguém num momento difícil?". 
Sempre (sempre mesmo) que vejo um casal começo-me a pensar "será que estas pessoas se amam realmente ou estão juntas só por estar". 

Oiço imensas histórias sobre como estão juntos porque têm medo de acabar sozinhos, porque acham que nunca vão encontrar ninguém que realmente goste deles ou delas. 
Um dia, a passar, ouvi uma senhora a dizer "pronto, agora arranjei alguém tão feio quanto eu". 
Estas coisas deixam-me a pensar se é possível realmente amar alguém incondicionalmente ou se isso é só coisa de filmes.


A simplicidade da cura e a incerteza da doença

Na última semana tivemos duas notícias completamente opostas relativamente à pandemia que colocou em suspenso muito do que queríamos fazer: a vacinação já começou em alguns países (e já tem data para começar em Portugal); e foi descoberta uma nova estirpe do vírus, sobre a qual sabemos muito pouco. Para mim foi interessante pensar na forma como estas duas notícias representam duas ideias opostas no esquema maior da pandemia: a cura contra a doença. E quais as suas representações e implicações na nossa comunicação.

Rudolf Arnheim, na obra Visual Thinking (1969), afirma que a relação da imagem com o real assenta nos seguintes valores desta, que são três: um valor de representação, um valor de símbolo e um valor de signo. Poucas imagens conseguem ser representar apenas um destes valores. Tomemos como exemplo um sinal de trânsito, como o sinal de STOP: tem um forte valor de signo (pela arbitrariedade da relação entre os elementos plásticos do sinal e o seu significado); tem também um forte valor simbólico (na obra A Imagem (2005), Jacques Aumont afirma que o valor simbólico de uma imagem é, acima de tudo, a aceitabilidade social dos símbolos representados);e tem um forte valor de representação (porque são a codificação de uma norma socialmente aceite e inscrita na lei de um país e/ou cidade).

Toda a simbologia e imagem à volta da vacina é muito simples. Não se pode dizer que é uma questão de tempo ou de habituação à existência das vacinas porque os vírus existem no nosso quotidiano há mais tempo. É mais a exploração da certeza versus a incerteza: uma vacina, a imagem de uma seringa com um conteúdo milagroso, que nos irá proteger dos males e da incerteza que os vírus nos trazem.

No caso do coronavírus não podemos dizer que exista uma imagem que, contendo os três valores já referidos, consiga ser o significante imagético para o significado do coronavírus. Conseguimos, sim, atribuir este papel a uma galeria de imagens, que representam as diferentes caraterísticas e consequências associadas ao COVID-19: as máscaras, o afastamento/distanciamento social, as ruas e cidades vazias, e a própria "caraterização" do vírus, que até já teve direito a diferentes desenhos e caricaturas que representassem sempre a sua malvadez (às vezes com sobrancelhas franzidas e normalmente de vermelho).

É curioso analisar que, mesmo em comunicação, a complexidade e a multiplicação de hábitos, normas e imagens a que associamos a pandemia contrasta em muito com a simplicidade da vacina. As próprias regras de confinamento parcial ou só aos fins-de-semana, que mudam também consoante o risco de cada conselho, não conseguem convergir numa única solução que as represente. Até os órgãos de comunicação social (nomeadamente as televisões) conseguem produzir muito mais notícias sobre o vírus e os seus efeitos do que sobre a sua cura. Porque a cura não é essa convergência: é a substituição, a troca de uma imagem por outra.

Se trocamos as imagens, trocamos os significados. Talvez com o começo da vacinação a hiper-produção de notícias sobre a incerteza seja substituída pela simplicidade da cura.



 Já não durmo faz hoje cinco dias. Chego à noite com sede de descanso e é sempre cedo que me deito. Fecho os olhos e a minha cabeça não pára “será que tranquei o carro?”, “esqueci-me de devolver aquela chamada outra vez… E de pôr a máquina a lavar”. Em seguida vem mais um episódio de: Vamos Lá Relembrar Todas As Vezes Que Respondi “Boa Tarde” Quando Me Disseram Bom Dia ou Disse Acidentalmente “obrigada para si também” Quando o Empregado Me Disse Bom Apetite. Depois de uma grande luta comigo mesma e várias tentativas falhadas de respirar fundo e relaxar, são outra vez seis da manhã mas lá adormeço. Corro no sonho, acordo cansada. São oito da manhã quando me levanto para abrir os emails que já tinha aberto enquanto sonhava. 

Passo o dia com o bater constante de duas pedras na cabeça e arrasto-me como fantasma pelas minhas tarefas naquilo que me parece um só dia infindável que dura faz agora uma semana. Tenho usado todo o meu tempo livre para ver filmes e pensar. Às vezes, no escuro, depois de tantas horas seguidas a viver em pequenos universos criados por artistas, sinto-me como se não tivesse mais certezas de nada. Vivo em períodos de (circa.) duas horas a possibilidade de ser tantas pessoas diferentes que levam vidas tão opostas! Fossemos nós peixes em memórias conscientes de ser humanos. Concluo que a realidade é pouco mais do que a nossa percepção da mesma. Posto isto, há algo de tranquilizante em saber não estamos sozinhos e que já se pensou muita coisa e se fez muita arte sobre as coisas que se pensou. Refugio-me no cinema por enquanto já que não consigo dormir (de momento recomendo o Nimas, no Saldanha, com o ciclo de cinema de Wong Kar Wai).

UM DIÁLOGO SOBRE UM MONÓLOGO


NARRADOR:
Em uma mesa de café da manhã bem-posta, duas figuras sentam- se uma em frente a outra. Os olhos se entrelaçam, e imediatamente as palavras se formam no ar.
PAULO:
Sabe o que eu acho mais estranho nos monólogos Isabel? (nome fictício, as identidades são indiferentes para o enredo subsequente)
ISABEL:
O que Paulo? (mais um nome inventado)
PAULO:
Quando se percebe que estás a falar sozinho...
ISABEL:
Mas, como sozinho? Normalmente uma plateia está a assistir ao monólogo.
PAULO:
Não necessariamente. Em tempos de cólera aguçados por amor e outras drogas – exatamente o que sempre vivemos neste planetinha mixuruca. Nos momentos em que somos os únicos a falar, estamos completamente sozinhos.
NARRADOR:
Isabel dá um gole em seu café, inebriada pelas palavras. Entretanto, ao mesmo tempo desacreditada acerca dos aforismos impostos a ela, àquela hora da manhã.
ISABEL:
Como podes ter tanta certeza Paulo? Ao auge dos seus menos de 100 anos em vida, tens absoluto credo do que falas?
NARRADOR:
Paulo se anima, Isabel sempre o indaga de forma empolgante.
PAULO:
Veja bem, meu docinho de coco. Em qualquer conversa feita (de preferência na mesma língua) eu penso no que quero dizer, através da fala – eu traduzo o que foi formado no meu pensamento. Entretanto, ao soltá-las ao vento como um dente de leão, elas percorrem um caminho tortuoso, e estão suscetíveis à todas as mazelas conhecidas e desconhecidas.
ISABEL:
Até parece que as palavras são frágeis e leves como os espólios de uma flor. Elas pesam como chumbo!
PAULO:
Exatamente, estás a pegar o espírito da coisa!
Em algum momento elas terão que pousar sobre ti...
Ou melhor, cair em queda livre.
ISABEL:
Certo...
NARRADOR:
Uma pausa é feita, e a buzina de um carro vinda da rua ao lado, corta os milésimos de silencio que inundaram a mesa. Paulo se levanta extasiado.
PAULO:
ISSO!
NARRADOR:
Em um rompante levemente exagerado, Paulo derruba o açucareiro no chão.
ISABEL:
Meu Deus, que susto!
PAULO:
Segundo Nietzsche, Deus morreu.
ISABEL:
Ele também, em 1900.
PAULO:
Essa são as mazelas pelas quais eu dissera que as palavras estão submetidas. Agora, a minha linha de raciocínio foi corrompida, e chegara cheia de desarranjos aos seus ouvidos.
ISABEL:
Agora a névoa se dissipou..., mas ainda assim, precisas limpar a nuvem açucarada da tábua corrida.
NARRADOR:
Isabel dá um risinho cheio de quartas intenções...
ISABEL:
A TGI de Shannon de repente se tornou mais interessante na tua voz.
PAULO:
Por isso amo-te!
ISABEL:
Mas ainda não percebi o que queres propor para que o monólogo se torne menos solitário.
PAULO:
As inserções que fizestes em meu monólogo explicam o fim da solitude.
ISABEL:
Obviamente nunca iria aceitar qualquer coisa vinda de ti passivamente.
NARRADOR:
Paulo termina de limpar os grãos de açúcar, levanta a cabeça e dá uma piscadela para Isabel.
ISABEL:
Portanto, suponho que a questão da linguagem seja justificada pela diminuição nas interferências. Correto?
PAULO:
Natürlich, meine Liebling
ISABEL:
E, se não for possível?
PAULO:
Precisaríamos de um meio termo. Oráculo, esfinge, Mãe de Santo, Narrador, Entidade, Tradutor, Mediador ou Médium. Chame do que quiser, a premissa é a mesma.
ISABEL:
Será essa mesa o nosso médium?
PAULO:
Talvez nosso amor.
ISABEL:
Ou isso.

NARRADOR:
Doravante seja a minha figura como mediador entre este pedaço de papel falante, e você, caro leitor. Pressuponho que esteja a pensar o que diabos este diálogo mequetrefe tem a ver com a mediunidade do Museu. Na verdade, o diálogo é a esperança do discurso museológico, o fim do monólogo, da solidão imposta. Da passividade do expectador. O Museu como intermediário entre a linguagem artística e os públicos. O carteiro do conhecimento. Assim como os narradores onipresentes, que modéstia parte, nos fazem ler as entrelinhas.




segunda-feira, 21 de dezembro de 2020

Plataformas de Streaming

 

Lembro-me dos tempos em que via televisão e era algo do meu dia a dia, lembro-me também de quando apareceram as plataformas de streaming como a Netflix e a HBO, por exemplo. Desde que estava no secundário que oiço falar destas plataformas, a certo ponto já toda a gente do meu “círculo” de amigos as usava, eu por outro lado ainda passei bastante tempo sem aderir a elas. Via as séries, filmes, etc… como sempre vi, na televisão.

Apesar de antigamente só dar para ver na televisão aquilo que estava a dar no momento, a menos que se gravasse especificamente esse programa, no secundário já não tinha esse problema, se quisesse ver alguma coisa que tivesse dado anteriormente poderia sempre voltar atrás e vê-las à mesma, logo a meu ver, na altura, estava feliz com o que tinha.

Foi talvez quando já tinha 18 anos que decidir aderir pela primeira vez a uma plataforma deste tipo, neste caso foi a Netflix, aderi ao período de teste que eles têm de 1 mês pois estava curioso para saber a razão do porquê de toda a gente estar a falar constantemente do Netflix e de outras plataformas do mesmo tipo.

Nesta a Netflix já tinha cerca de 118 milhões de subscritores e continuava a crescer a um ritmo muito rápido, percebi que o alarido todo sobre a Netflix não existia só no meu grupo de amigos, mas sim no mundo inteiro.

Em 2020 a Netflix já tem cerca de 195 milhões de subscritores, por isso claramente ainda não deu sinais de abrandamento nos próximos tempos.

Durante o período de teste apercebi-me que o facto de ter “todas” as séries e filmes (pelo menos pensava eu na altura) na palma da minha mão(telemóvel) alterava completamente a dinâmica que existia entre mim e as séries/filmes. Dei por mim a poder ver o que me apetecia, quando me apetecia, percorrendo séries atrás de séries, ao pequeno-almoço, no comboio, a caminho da universidade, ao jantar, etc… dei por mim a utilizar esta plataforma mais do que qualquer uma que tinha, pois realmente tinha uma facilidade que a televisão não tinha, pois não tinha como a levar para todo lado, e mesmo que tivesse, não tinha o conteúdo que estas plataformas têm que se pode ver quando queremos. Digamos que já não me sinto aborrecido durante as viagens que faço para a universidade, onde vou sozinho e antigamente dava por mim sem nada para fazer.

Digamos que obviamente, ao acabar o período de teste, aderi à plataforma e continuei a utilizá-la até hoje.

No meio de tudo isto notei apenas um problema, que começou a aparecer-me há não muito tempo, dei por mim já a sentir que tinha visto tudo o que me interessava no Netflix, foi aí que me apercebi que o conteúdo apesar tudo ainda é bastante limitado nestas plataformas, entre os contratos e as compras que têm de fazer para ter os direitos de ter estas séries e filmes nas suas plataformas acabava por haver uma guerra entre todas estas plataformas, por isso dou por mim agora a ter de aderir a outras plataformas deste tipo como a HBO ou a Amazon prime, para ter acesso a muitas outras séries e filmes que me interessa, o que me acaba por chatear um bocado devido a ter de aderir a todas elas, a maioria pagas, passar pelos mesmos processos, etc..

Pode ser que no futuro as coisas mudem um bocado e isto esteja mais facilitado, seja parceria entre as próprias plataformas de maneira a facilitar as transições entre utilizadores ou outras coisas, quem sabe…

Se há uma coisa que sei, é que apesar de sentir que já vi muito do conteúdo que me interessa nestas plataformas, fico contente por ter aderido a elas, pois facilitam-me muito tudo no que toca a esta atividade de lazer que sempre me interessou muito.

Preguiça vs Motivação

    Nos últimos meses vivemos “presos”, estamos em tempo de pandemia e o local mais seguro onde podemos estar é nas nossas próprias casas.

    A nossa casa transmite-nos sensações positivas tais como conforto, bem-estar, tranquilidade e segurança. No entanto estar 24 horas por dia, 7 dias por semana em casa pode causar dois tipos de sensações: pode tornar-se aborrecido e cansativo, ou por outro lado bastante agradável e motivacional.

    Em tempos de pandemia o tempo livre das pessoas aumentou. O trânsito, os almoços demorados, os convívios e festas entre muitas outras atividades diminuíram radicalmente nas vidas de cada um, adicionando as pessoas horas livres, ou seja, horas onde o indivíduo não tem qualquer tipo de atividade para fazer.

    Este tempo livre acrescido, pode, tal como a permanência excessiva em casa, causar aborrecimento ou por outro lado motivação e felicidade, dependendo de cada pessoa e da sua personalidade.

    Numa primeira perspetiva, o tempo extra e a prolongada estadia em casa podem causar preguiça. A preguiça é inimiga de produtividade, existe uma falta de disposição por parte do individuo para realizar as suas tarefas. Este sentimento acentua-se quando a atividade não é do interesse do sujeito.

    Por outro lado, numa segunda perspetiva, passar o dia em casa e ter muito tempo livre pode causar o sentimento inverso, a motivação. Com motivação as diversas tarefas são feitas com mais empenho e de maneira mais eficiente. Com mais tempo o sujeito pode realizar outras atividades do seu agrado, disfrutando de momentos de lazer para si próprio. Esta motivação pode surgir pelo facto do indivíduo se sentir bem com o ambiente ao seu redor.

    Em suma, as duas sensações que podem ser causadas pela vida que vivemos atualmente estão diretamente relacionadas com a criatividade de cada pessoa. Quanto mais criativa mais ideias têm, com essas ideias as pessoas descobrem novos gostos e novas paixões, fazendo algo que gostam, desta maneira o sentimento de preguiça, cansaço e falta de proatividade vai desaparecendo.

E se um algoritmo pudesse descobrir a cura para o SARS-CoV-2?

 

Inteligência artificial (IA) é um conceito que cada vez mais está presente nas nossas vidas. Todos os dias vários aspetos do nosso quotidiano são influenciados por algoritmos de inteligência artificial, muitas das vezes sem nos apercebermos. Por exemplo, sempre que usamos serviços como Netflix, YouTube, Spotify, HBO, Amazon, entre muitos outros que existem, o sistema de recomendações destes serviços foi desenhado com base em sistemas de inteligência artificial.

Sempre tive um grande interesse pela área da tecnologia, embora nunca tivesse investigado muito sobre inteligência artificial. Apenas há cerca de um ano é que comecei a demonstrar mais interesse nesta área, quando me foi oferecido o livro: A Revolução do Algoritmo Mestre. Um livro que aborda a inteligência artificial e a descoberta de um super algoritmo de aprendizagem automática, evidenciando não só as suas vantagens, como também as suas desvantagens.

A Revolução do Algoritmo Mestre, é uma obra da autoria de um professor e investigador português em Ciências da Computação na Universidade de Washington. Este livro é um dos dois livros que Bill Gates recomenda a qualquer pessoa interessada em inteligência artificial. Pedro Domingos refere que o mundo será muito diferente após a descoberta do super algoritmo, a que chama de algoritmo mestre, vai ser possível fazer coisas que hoje não são possíveis fazer. Sendo uma delas curar o cancro. Pedro Domingos numa entrevista ao Observador diz que os Algoritmos não substituem os médicos, mas vão torná-los mais poderosos. [1]

Recentemente em março de 2020, um algoritmo desenvolvido pelo MIT descobriu um antibiótico que consegue destruir um germe sem cura. Segundo uma notícia da Visão, a 17 de março do mesmo ano, equipas do MIT, de Harvard e do CSAIL anunciaram que foi possível descobrir um antibiótico com propriedades curativas inéditas, através de um sistema de aprendizagem profundo.

Outro caso de um algoritmo de inteligência artificial que está a ser usado na área da saúde, neste caso, no combate à covid-19, anunciado há cerca de um mês e meio, refere que uma equipa de investigadores do MIT desenvolveu um sistema de inteligência artificial capaz de identificar pessoas infetadas com a covid-19 pelo som da tosse, mesmo em doentes assintomáticos. Os testes desenvolvidos ao algoritmo tiveram uma taxa de sucesso de 98.5% em casos confirmados e em doentes assintomáticos, a fiabilidade dos resultados foi de 100%.

Concluindo, há muitos outros projetos com aplicações na saúde a serem desenvolvidos a nível mundial, quer por Universidades, quer por empresas. Acredito que, até já esteja a ser desenvolvido ou até mesmo usado um algoritmo que possa permitir descobrir uma cura eficaz para o SARS-CoV-2. 

Nada é impossível até que se prove o contrário.

 

Referências:

[1] Observador. Observador On Time. Acedido em dezembro de 2020 em https://observador.pt/especiais/a-entrevista-ao-portugues-que-bill-gates-recomendou-e-que-diz-que-os-algoritmos-vao-curar-o-cancro/

O valor dos valores

 

O mundo em que vivemos está cheio do bombardeamento de mensagens subliminares e uma manipulação psicológica subtil, quase impercetível. Há um sítio na sociedade ocidental que mais temo. Que engole almas, corrói espíritos, altera a perceção do tempo, efetua uma profunda e eficiente lavagem cerebral e mexe com a ansiedade de qualquer ser humano. No caso do caro leitor, por não se relacionar com a descrição anterior, não ter adivinhado já ao que me refiro, então informo-o que possivelmente é portador da doença mais comum do século XXI: o consumismo.

Está certo, o sítio que destrói a minha sanidade mental (e a de muitos outros) são os centros comerciais. Aliados à indústria publicitária, constituem a arma mais forte contra o desapego material natural que podemos observar nos restantes animais. Nós, mamíferos especiais, chegámos ao ponto de resumir a nossa identidade e felicidade aos objetos que nos rodeiam. Ferramentas auxiliares do dia a dia tornam-se, em casos mais graves desta doença, parte do próprio consumidor.

Mas como chegámos a este ponto? Com uma estrutura social que constantemente nos lembra que precisamos de algo e que esse algo tem imenso valor.

“Olha só o novo brinquedo que comprei para mim!” diz o doente adulto enquanto me apresenta com a maior alegria o seu mais recente tablet, possuindo também outros três funcionais. O diagnóstico é simples: alguém que compra frequentemente mais dos objetos que já tem consigo; não dá uso a 100%, o que lhe importa mais e o seu maior valor é tê-lo; tem um cuidado quase obsessivo para o objeto não ficar desgastado do uso, ou cuidado nenhum porque sabe que pode sempre substituí-lo; exibe ou fala das novas aquisições como tema de conversa frequente.

Não o julgo. Aliás, esta lavagem cerebral começa desde tenra idade em que na época natalícia só se ouve jingles repetitivos de anúncios que apresentam imagens de imensidões de presentes enquanto soa “brinquedos, brinquedos eles são o nosso meio de alegria!”. Mentes flexíveis e imaturas crescem com a influência de que só é melhor quem tem mais, do mais caro.

Os centros comerciais são a materialização desta mentalidade consumista, e onde ela chega ao seu apogeu de realização. Montras brilhantes e belas, produtos bem organizados e esteticamente prazerosos, até os odores fazem parte deste processo!

Aquilo que realmente mexe comigo nestes espaços é que, para além de ver a obsessão e a falta de humanidade das pessoas que me rodeiam pela aquisição dos materiais, sinto a entrar na minha mente o desejo de consumir numa contradição interna de racionalmente ter conhecimento do funcionamento doentio deste sistema, mas sentir o prazer inevitável em ver tantas coisas que poder-me-iam servir.

Apanhei do chão 1,20 que um senhor deixou cair à pressa, segui-o uns metros para lhe devolver as moedas, ele olhou tão surpreso e incrédulo com o gesto perguntando-me “Andou isto tudo para me devolver dinheiro?” e eu pensando “Claro, são pedaços de cobre, níquel e latão que não me pertencem.”. No fim recebi um “Deus abençoe”, por entregar um metal que não é meu. É com agradecimento que recebo a bênção, porém logicamente sei que veio da imprevisibilidade de alguém, das cem pessoas que saíram do barco, tomar a decisão incomum de não ficar com pedaços de metal ao qual atribui um valor ridículo. 

É uma reação tão universal que não me surpreende.

Consumidores lutam por uma televisão na "black friday", Luke MacGregor, 2014 
Fonte: https://www.washingtonpost.com/

MARX, Karl. O Capital: Crítica da Economia Política, vol. 1. Moscovo, Lisboa: Progresso, Avante!  


"Me-time"

 Sempre me considerei uma pessoa reservada e todos à minha volta parecem concordar. À data, o meu círculo de amigos consiste em três outras pessoas. Não tenho dificuldade em criar relações, mantê-las e fazê-las durar é o problema. 

Por outro lado, sempre preferi estar sozinha, sobretudo em casa. Trabalhar é muito mais fácil quando sou só eu, a música e os gatos. Por isso, quando este ano letivo começou e a minha irmã voltou às aulas, eu sabia que ia ser muito mais produtiva. As minhas aulas iam ser todas por videoconferência. Eu ia estar sempre em casa. Com mais ninguém durante a maior parte do dia.

E assim foi, ao longo de mais uma série de meses em casa com poucas saídas e quase nenhum encontro com amigos, só eu e os gatos. Criei novas rotinas e hábitos adaptados ao tempo que passo sozinha. Ao fim de cada dia penso no seguinte, procurando quais as horas em que mais alguém vai estar em casa e planeio as minhas atividades de acordo.

Agora aproximadas as férias de Natal, vê-se cada vez mais difícil focar seja no que for. A televisão voltou, o pequeno almoço madrugador, os ruídos no quarto ao lado também. Em suma, a minha irmã voltou. E é triste como a minha primeira reação a esse facto foi negativa. A minha irmã de quem tanto gosto, de quem tanta falta senti durante o primeiro grande confinamento no início do ano, agora vai estar sempre comigo em casa e isso chateou-me.

Pergunto-me quando fiquei egocêntrica? Ou se sempre fui? Pelo menos nunca achei, nunca me o chamaram. Mas está tudo na minha cabeça, atenção. Não me chateio com ninguém, muito menos com os gatos, por estarem em casa, por fazerem "barulho" Isso só me irrita a mim. E agora é o facto de isso me chatear que me chateia.

Antes disto tudo estava constantemente rodeada de outras pessoas, mesmo se contrariada. Participava em projetos, fazia desporto, ia à rua. Tudo o que eu queria de vez em quando era tempo para mim. Chegada a oportunidade, comecei a criar projetos online, a comunicar e trabalhar com pessoas do outro lado do mundo e a fazer algum free-lance. Apesar de ter interações, todas são através de um ecrã que não lhes garante uma forma. Quando apenas penso no que tenho que fazer e imagino os meus projetos, não tenho nada para ver. Os ficheiros são todos em formato digital, as pessoas com quem trabalho não aparecem à minha frente, a maioria nem nunca as vi. Crio as suas imagens na minha cabeça, um mundo meu que não consigo partilhar com mais ninguém.

Diz-se que somos influenciados por quem nos rodeia. Estar demasiado tempo apenas com a minha pessoa influenciou-me de maneira redundante. Eu influencio-me, mas eu sou eu. O foco está todo no eu. Será então que foi demasiado "me-time" a causa de todo este disparate.


Sou uma menina

O que nos faz olhar para um produto e nos sentirmos atraídos por ele? Este desejo de possessão e identificação é algo involuntário, independente de cada um de nós enquanto indivíduos, ou um produto de regras e ideias que nos foram incutidas sem nos apercebermos? 

    Foi uma pergunta que surgiu e que me deixou apreensiva por ser algo que nunca tinha questionado, e agora que o fazia, parecia absurdo pensar na possibilidade dos meus gostos não serem pessoais, uma ideia assustadora. Afinal que entidade é esta que sempre julguei ser eu? 

    O mundo é tão diverso e no entanto, esta minha identidade é quase idêntica ao resto das pessoas. Como é que isto é possível? Sendo que sou livre e honesta comigo mesma enquanto construo a minha pessoa, respeitando os meus desejos e vontades?

    A minha identidade, começou se a manifestar antes sequer do meu nascimento. Estava eu na barriga da minha mãe e metade dos meus atributos enquanto indivíduo já estavam definidos e resolvidos, sou uma menina. A questão é que associada a essa única palavra de ‘’menina’’, definida pelo meu sexo, estão milhares de concepções que são imediatamente determinadas e delimitadas. À medida que cresço aceito e desenvolvo inconscientemente todas essas concepções, porque nem coloco a hipótese de não o fazer. 

    Estas concepções desenvolvem-se em redor da “minha” sexualidade que é algo decretado a partir do meu sexo. É à partida inquestionável e molda a minha identidade, que sempre tomei como inerente à minha pessoa. É o normal, e o que está para além do normal soa duvidoso e incorreto. 

    Mas não consegui de deixar de pensar sobre isto, e comecei a achar injusta a maneira de como idealizo e construo a minha pessoa. Senti uma estranha sensação de sufoco por me aperceber das limitações que definem a minha sexualidade que sempre assumi e nunca ponderei.

    No outro dia estava a olhar para a televisão enquanto passavam anúncios. Apercebi-me que maior parte deles eram dirigidos ou para o homem, ou para a mulher, era muito raro aparecer um anúncio cujo público alvo fossem ambos os sexos em simultâneo. Questionei-me do porquê de existir esta espécie de restrição que faz com que as mulheres e os homens se sintam atraídos para produtos que evidenciem a sua sexualidade, no entanto não consegui encontrar uma resposta que me deixasse satisfeita. E porque é que toda a gente se conforma com esta maneira de consumir e produzir o que vai de encontro à sua sexualidade? Porque é que o facto de fugirmos a estas concepções é considerado fora do normal? São questões que me deixam a pensar e às quais ainda não consegui responder.